domingo, 13 de maio de 2012

Conceição da Barra. Prefeito preso e incerteza política

Prefeito preso e incerteza política

Donati é acusado da morte de um sindicalista, a vice-prefeita assumiu a cidade e um grupo de 12 partidos se une num projeto de oposição


foto: Marcos Fernandez / GZ

"Está acontecendo uma investigação tendenciosa, que contaminou a boa-fé das outras instituições, como o Ministério Público e o Judiciário"

Jorge Donati (PSDB), prefeito preso, em entrevista publicada em A AGAZETA no dia 13 de abril

Balneário cercado por dunas e belas paisagens, Conceição da Barra virou destaque nos últimos dias pela prisão do prefeito Jorge Donati (PSDB), acusado de ser mandante de assassinatos. Há um mês o município é comandado pela vice-prefeita Adélia Marchiori (PPS). As suspeitas que pesam contra Donati prometem pautar o processo eleitoral e deixam a corrida sucessória em aberto.

Enquanto Donati busca a reeleição, um grupo de 12 partidos se uniu para lançar um nome de consenso contrário à atual administração. Entre os cotados estão os ex-prefeitos Manoel Pé-de-Boi (PSB) e Chico Donato (PMDB).

Aliada do tucano, a secretária de Educação e prefeita interina diz que Donati é alvo de perseguição política. "Está sendo feita uma injustiça contra ele. A maneira transparente como Jorginho administra incomoda as pessoas".

Donati é acusado pelo Ministério Público Estadual (MPES) de mandar matar o ex-presidiário Mateus Ribeiro dos Santos, o Mateusão – crime ocorrido no último dia 5 de abril. Ele era testemunha do assassinato do sindicalista Edson José dos Santos Barcellos, que tem Donati apontado como mandante do crime.

"Isso caiu em cima de Jorginho. É um problema político", defende Adélia.

O próprio prefeito, em entrevista para A GAZETA em abril, negou envolvimento com os assassinatos, disse que o "inquérito é uma farsa" e que é inocente.

Adélia destaca que a atual gestão tem feito várias obras na cidade e investindo principalmente em infraestrutura e calçamento, o que será mostrado na campanha. Mais de 20 quilômetros de ruas e avenidas foram calçadas. Em 120 anos de existência do município, de um total de 140 quilômetros de vias, apenas 32 estavam calçadas até 2009, segundo dados da prefeitura. A orla está sendo restaurada e urbanizada.

Outras áreas contempladas, segundo Adélia, foram a Educação e a Saúde. A sede da prefeitura foi reconstruída e aguarda a volta de Donati para ser inaugurada, segundo a prefeita interina. "Espero que ele volte o mais breve possível".

O plano A para o processo eleitoral de outubro é repetir a dobradinha Donati e Adélia. Apesar de Donati estar preso, a legislação eleitoral não o impede de disputar a eleição, já que ele não tem nenhuma condenação e permanece com seus direitos políticos. "Só se ele não puder mesmo é que venho como candidata a prefeita", disse Adélia.

OposiçãoUm grupo de 12 partidos, porém, já se uniu para lançar um nome de consenso contrário à atual gestão. O bloco inclui o PSB, PMDB, PT, PDT, PSD, PV, PT do B e PC do B. Todos os 12 partidos têm pré-candidatos, mas quem tiver maior densidade eleitoral deve ser o candidato do bloco.

"Esse grupo está 100% unido", garante o presidente da Câmara, Ângelo César Figueiredo (PSD), o Anjinho, que também colocou o nome à disposição do bloco. Segundo ele, a principal aposta é o ex-prefeito Manoel Pé-de-Boi (PSB). Outro nome que se destaca é o do ex-prefeito Chico Donato (PMDB), primo de Donati, que disputou com ele na eleição de 2008.
foto: Vitor Jubini / GZ

"Donati é um bom administrador"

Nascido na Bugia, o pescador e comerciante Mateus Francisco da Silva, 52 anos, elogia a gestão de Jorge Donati. "Ele é um bom administrador. Independentemente das acusações, votaria nele". Para ele, que perdeu três casas por conta do avanço do mar na Bugia, cabe à Justiça julgar as acusações contra Donati. "Quem sou eu para julgar alguém", disse em meio ao que sobrou da penúltima casa que morou.
Para Anjinho, a situação "mancha a imagem do município". "É muita coincidência para uma pessoa só os crimes que pesam contra ele", disse, lembrando ainda do duplo assassinato da Ilha do Frade, que Donati é apontado como mandante.

"O Donati não está trabalhando para os moradores daqui, mas para os turistas. Ele está dando ênfase só ao calçadão", disse. Ele reconhece que o prefeito tem maioria na Câmara, o que inviabilizaria uma posição mais crítica do Legislativo.

Manoel Pé-de-Boi disse que o grupo ainda está conversando, mas afirmou que Donati "entrou na política para ter foro privilegiado", após ser acusado de ser o mandante dos assassinatos da então mulher dele, Cláudia Soneghete, e da arrumadeira Mauricéia Donato, que morreram carbonizadas, em 2003, em Vitória. "São acusações muito graves. Ninguém fica preso se não deve", afirmou.

Na última terça e quarta-feira, A GAZETA ouviu alguns moradores da cidade, no Norte do Estado. Para a maioria, as sérias acusações contra o prefeito parecem não incomodar. Eles elogiam a atual gestão.

"Nunca houve um gestor que trabalhasse como esse prefeito. Ele está trabalhando sério", disse o bombeiro Enéas Ferreira Pinto Filho, 38 anos. Para o morador do Bairro Nova Esperança há mais de 30 anos, as acusações que pesam contra Donati "são problema da vida particular dele". "É perseguição política porque, com certeza, ele será reeleito se for candidato".

Mesmo entendimento tem o comerciante Ângelo Faustino, 39 anos, morador da Bugia. "A cidade ficou 12 anos parada no tempo. Só evoluiu a partir desse prefeito". E as denúncias? "Não acredito", resume.

O problema do avanço do mar na região da Bugia, que se arrastava por mais de 30 anos e que destruiu vários imóveis no local, foi solucionado pelo governo do Estado, em 2010, dentro da gestão de Donati. A obra realizada pelo Estado pode trazer dividendos eleitorais para o tucano.

A reportagem também constatou que alguns moradores, contrários ao prefeito, preferem não comentar as acusações contra Donati por "medo", já que "ele é influente", alegam.

Hotel BarraMar


O farmacêutico e professor Cássio de Almeida Toscano, 26 anos, morador da Sede, é um dos poucos a falar. Ele chama as obras em andamento de "maquiagem". "São obras que não buscam o desenvolvimento direto da cidade. São obras faraônicas. Não têm preocupação com a questão social. Gastaram R$ 1,5 milhão com a compra do Hotel BarraMar, que não tem utilidade nenhuma", disse.

A compra do imóvel, localizado em área de preservação ambiental permanente, é alvo de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Estadual (MPES) em setembro de 2011. Para evitar prejuízos ao erário, o MPES conseguiu que a Justiça bloqueasse parte do pagamento dessa compra e que prefeitura ficasse impedida de reformar o hotel.

Adquirido para abrigar as secretarias de Turismo e de Educação, duas escolas e um centro de convenções, no imóvel só há uma sala em funcionamento, cedida ao Iema, onde funciona a Área de Proteção Ambiental de Conceição da Barra.

Toscano também rebate a defesa de Donati. "As denúncias contra ele são graves. Um prefeito para chegar a ser preso é porque os indícios são muito fortes. Falar em perseguição política é tirar o crédito do Judiciário". Ele afirmou ainda que o comércio local vive uma "crise econômica sem precedente".

As principais empresas da cidade são as usinas de álcool Alcon e Disa, que pertencia à família do prefeito. Elas, junto com a prefeitura, são as maiores empregadoras da população local, estimada em 28,5 mil habitantes pelo IBGE.

Dono de uma pousada na Vila de Itaúnas, Sérgio Grossi Fabrino, 59 anos, diz que a prefeitura poderia fazer muito mais pelo turismo, como asfaltar o trecho de 20 quilômetros de estrada de chão que leva até o local. "Quando chove a situação fica precária. A infraestrutura na alta temporada deixa a desejar". Apesar de dizer que as acusações contra Donati "são graves", ele prefere não fazer "pré-julgamento" do caso.

Vale lembrar ainda que dois ex-prefeitos da cidade, Mateusão Vasconcelos e Nélio Ribeiro Nogueira, também estão presos, mas em regime semiaberto. Mateusão está preso por ter omitido informações e ter prestado falsas declarações ao Fisco. Já Nélio foi condenado por crime de responsabilidade por apropriar-se de bens ou rendas públicas ou desviá-los em proveito próprio ou alheio, e por utilizá-los indevidamente.
Acusação

Ex-presidiário

Mateus Ribeiro dos Santos, o Mateusão, foi morto com 12 tiros no dia 5 de abril, em uma mercearia de Linhares.

Sindicalista

Mateusão era testemunha da morte do sindicalista Edson José dos Santos Barcellos, morto no dia 6 de julho de 2010, em Conceição da Barra, com um tiro na testa. O MPES acusa o prefeito Jorge Donati de ser o mandante dos crimes. Donati nega envolvimento com os assassinatos. Edson era secretário do Sindisbarra e presidente do DEM no município e autor de críticas à gestão.

Prisão

Por conta da morte de Mateusão, Donati está preso no Quartel de Maruípe desde o último dia 13 de abril. Em janeiro deste ano, o prefeito já tinha ficado 15 dias preso por conta do assassinato do sindicalista.

Ilha do Frade

Além disso, Donati é acusado de outro crime, em 2003, no qual morreram carbonizadas a então mulher dele, Cláudia Soneghete, e a arrumadeira Mauricéia Donato. O crime ocorreu na Ilha do Frade, Vitória. Donati também alega ser inocente nesse caso.

Condenação

Os irmãos Cristiano e Renato dos Santos Rodrigues, acusados de matar Cláudia e Mauricéia, foram condenados na sexta-feira. Cristiano recebeu pena de 41 anos e seis meses de reclusão em regime fechado e Renato foi condenado a dois anos e 11 meses em regime aberto. Os dois afirmaram durante o julgamento que Donati era o mandante dos crimes.
Família de sindicalista cobra a "verdade"

Mulher do sindicalista assassinado Edson José dos Santos Barcelos, a pedagoga Edma da Silva afirma não ter dúvidas de que o prefeito Jorge Donati é o mandato do crime e que a "verdade vai prevalecer".

"A influência dele é grande. Espero que a Justiça continue trabalhando. A verdade vai prevalecer".

Para ela, a condenação, na sexta-feira, dos irmãos Cristiano e Renato dos Santos Rodrigues, acusados de matar a empresária Cláudia Soneghete Donati, então mulher do prefeito, e a doméstica Mauricéia Rodrigues, assassinadas em 2003, na Ilha do Frade, "reforça" as acusações que pesam contra Donati. "A justiça está sendo feita".

Ela rebate a afirmação de Donati de que é vítima de perseguição política no caso do assassinato de Edson. "Isso não existe". Edma espera que Donati seja julgado logo no caso da Ilha do Frade e no que envolve a morte do seu marido. "Se a justiça for feita, espero que ele não seja candidato".

O que os moradores pensam de Donati
foto: Vitor Jubini / GZ

"A maneira transparente como Jorginho administra incomoda as pessoas. Ele vai provar que é inocente".
Adélia Marchiori (PPS), Prefeita interina
"Ninguém fez o que Donati fez em quatro anos de gestão. Ele sofre perseguição em ano de eleição"
Nilton Almeida Mercedes, Pedreiro, 28 anos, morador da Vila dos Pescadores
"Quando chove, a situação fica precária. A infraestrutura na alta temporada deixa a desejar"
Sérgio Fabrino, Dono de pousada em Itaúnas, 59 anos


"Aqui não há preocupação com a questão social. As obras são maquiagem. Um prefeito não fica preso sem indícios fortes"
Cássio Toscano, Farmacêutico, 26 anos, morador da sede

Vera Ferraço
A Gazeta

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